palavras do Guruji

viagens pelo mundo afora e pelo universo dentro de mim


"Você não precisa viajar a um lugar remoto para buscar a liberdade; ela habita seu corpo, seu coração, sua mente, sua Alma. A emancipação iluminada, a liberdade, a pura e imaculada felicidade estão a sua espera, mas você precisa escolher embarcar na jornada interior para descobri-las."
B.K.S. Iyengar em Luz na Vida

22 de setembro de 2013

Āsana no contexto do Yoga Sūtra de Patañjali


Nos dois primeiros capítulos do livro “The 18 Mahākriyās of Yogāsana” antes de entrar propriamente no tema e explicar os diferentes Kriyās, Prashantji define āsana no contexto dos Yoga Sūtras de Patañjali e explica āsana como fim e como meio. A seguir, o resumo do 1º capítulo.

Capítulo 1: Significado de āsana com referência ao contexto no texto

Para esclarecer o significado de āsana com base nos Yoga Sūtras, a primeira pergunta a ser feita é: onde estão as referências a Yogāsana no texto de Patañjali?

Āsana é mencionado no esquema do Aṣṭāṅga Yog. É o 3º dos 8 membros do Yog dai concluímos que seu objetivo não é meramente a saúde física e mental, mas inclui os objetivos e propósitos finais do Yog.

A 1ª referência de Patañjali a āsana é feita no 28º aforismo do Capítulo II (II-28). E Prashant Iyengar faz a pergunta: Por que Aṣṭāṅga Yog é mencionado ali?

Para superar Aśuddhi ou tendências, propensões, Kleśa Vāsanā e Karma Vāsanā. O esquema de Aṣṭāṅga Yog também é explicado como os meios de obtenção de conhecimento supremo, realização, discernimento e Sākṣat karaṇa (3.18 - "ato de tornar visível", "observação")* de Vivekakhyāti. E por que deve haver Vivekakhyāti? Principalmente porque esta intelecção é o meio para Kaivalya (Hānopāya).

Esta Vivekakhyāti vai dar fim a conjunção do observador e do observado, que é a causa de sofrimento/dor/tristeza (Heyahetu). Esse sofrimento é classificado em II-15 como pariṇāma duḥkha, tāpa duḥkha, saṃskāra duḥkha e guṇavrttivirodha. São também chamados de evitáveis e sua causa é a conjunção entre observador e observado causada por Avidyā.

A dissolução de Avidyā é alcançada na fase culminante da intelecção chamada de Aviplava Vivekakhyāti e os meios de se alcaçar Vivekakhyāti por Aśuddhi Kṣaya é Aṣṭāṅga Yog e āsana é um dos oito membros.

Aqui aparece a questão se o 3º membro do Aṣṭāṅga Yog, Āsana, trabalha para o bem material e mundano e para o senso de bem estar. A resposta para isso é que, embora Anuṣṭhān (disciplina) do Yogāsana seja um paradigma essencial, ainda assim o processo de aprendizado e obtenção de āsana é muito recompensador e gera muitos frutos, inclusive subprodutos como saúde, condicionamento e remédios para o bem viver.

Embora verdadeiras, essas atuações e conseqüências dos āsanas são muito rudimentares e em planos mais altos são desclassificados até mesmo de serem chamadas de yog ou de yogāsana.

A valiosa recompensa concedida por Yog é tamanha que até mesmo a mais superficial aparência de āsana pode agraciar e corrigir o propósito mundano da vida.

Pseudo āsana e pseudo yog definitivamente cumprem objetivos da vida mundana e material.

Porém em seu livro, Prashantji não lida com pseudo āsanas ou posturas, ele refere-se a Yogāsanas. Aqui o autor abre uma nota dizendo que o termo Anuṣṭhān pode ser processado precisamente como atos cerimoniosos, ritualísticos e religiosos; a intenção sendo a de mostrar que não são atos de cultura física, mas sim inseridos no quadro e ethos do Dharma.

No Sādhana Pāda (Cap. II), Patañjali menciona Caturvyūha que é similar ao conceito de 4 estágios da medicina tradicional indiana: doença; causa da doença; o estado de ser livre da doença; e finalmente, os meios para ser livre da doença.

Similarmente em Yog temos 4 estágios:
1)    Sofrimento na perspectiva Paramārtha e não mundana.
2)    Causa do sofrimento não mundano
3)    Estado de liberação (Mukti/ Kaivalya)
4)    Os meios da liberação

Esses 4 estágios são:
1)    Heya: sofrimento evitável que é ainda por vir (anāgata duḥkha).
2)    Heyahetu: causa do sofrimento evitável que é a conjunção entre vidente e visto (drśyādrśyasaṁyogah).
3)    Hānam: estado de não sofrimento chamado de Kaivalya (saṁyogābhāvah).
4)    Hānopāyam: os meios para a liberação. Ininterrupto Vivekakhyāti na fase culminante (vivekakhyāti saptadhārāntabhūmi).

Assim, a intelecção vem a tona por um processo chamado de Sistema ético-religioso que é Aṣṭāṅga Yog. E o Yog de 8 membros é o meio para erradicação das impurezas na forma de Kleśa Vāsanā e Karma Vāsanā (aśuddhikśaya), e obtenção de Vivekakhyāti (meios para a liberação).

Todo o esquema do Aṣṭāṅga Yog, então, tem como objetivos os mencionados acima. Todos os 8 membros nos provem desses propósitos desde Yama e Niyama até Samādhi.


Como estudantes de Yog devemos entender que o propósito de yogāsana essencialmente é: pavimentar o caminho, facilitar e equipar o vindouro Vivekakhyāti, que é o meio para a liberação (Mukti, Nirvāṇa e Kaivalya). Não é para o bem estar mundano ou mera saúde física e mental.”


Yogāsana deve essencialmente e substancialmente trabalhar para: Aśuddhi (tendências) Kṣaya de citta e obtenção da sabedoria que leva a Vivekakhyāti. Como já foi repetidamente falado não é para a saúde e bem estar físicos, fisiologia saudável, nem para o bem estar e a saúde mental e psicológica. Apesar desses efeitos mundanos surgirem através do processo de fazer, aprender, obter e praticar āsana.

Prashantiji encerra o capítulo dizendo que chegamos a alguns teoremas e um deles é:
“Āsanas não são para o corpo como são vistos e popularmente considerados pela maioria dos praticantes. São, porém, pelo corpo para a mente, citta, psique, consciência e lócus dos Vāsanās.”




Padmāsana (imagem pesquisada na internet)

P.S. Gostaria de agradescer meu querido professor de sânscrito João Carlos B. Gonçalves pela correção dos termos em sânscrito e das sugestões de tradução.
*no original Sakshatkar de Vivekakhyāti

7 de setembro de 2013

Yogasana por Prashant Iyengar



Prashant Iyengar acaba de publicar mais um livro, Yogasana (The 18 Maha Kriyas of Yogasana - philosophy, religion, culture esoterics and mysticism of yogāsana) (Yogasana, os 18 Mahakriyas do Yogasana - filosofia, religião, esoterismo e misticismo do yogasana, em tradução livre). Ao contrário do título super longo, o livro não é dos mais grossos, tem 193 páginas e o tamanho da fonte é bem ok.

A introdução já é uma jóia. A seguir, um resumo do que li.

O que comumente chamamos apenas de āsana quer realmente dizer yog-āsana, o 3º aspecto do Aṣṭāṅga Yoga descrito por Patañjali em seu tratado Yoga Sūtra. Āsana não significa apenas postura, como é muita vezes traduzido. Āsana é yog

Em sânscrito āsana significa assento, lugar pra sentar, ou sentado. Mas āsana não significa tampouco postura sentada.

Āsana (em qualquer posição que o corpo físico esteja) deve ser um assento para a consciência, ou para as coisas mentais, ou ainda para toda a constituição de “eu”, “mim” e “meu” da personificação. Ou seja, para citta.

No 2º capítulo do Yoga Sūtras, Patañjali define āsana como:

स्थिरसुखमासनम् 
sthirasukhamāsanam

Ao contrário do que muitas vezes ouvimos, a tradução desse aforismo não é: āsana é uma posição física fácil e confortável.

Ele sinaliza que toda a personificação precisa estar em facilidade, conforto, benevolência, quietude, consolo e generosidade. Em yogāsana, citta tem que estar em estabilidade e benevolência. A condição para meditação e transe deve ser cultivada.

O conceito inicial é o de que āsana deve ser estável, confortável e benevolente para propósitos físicos, psicológicos e empíricos. 

Mas ser estável, confortável e benevolente para Dhyāna (meditação, absorção e transe) é incomparavelmente diferente. E o livro do Prashant lida com esse 2º conceito.

Āsana deve ser uma posição, uma condição e um estado efetivos, produtivos, condutivos, fáceis, confortáveis, belos e graciosos.

Segundo Prashantji, Patañjali opina que āsana deve facilitar, ser o gatilho, ser a causa e gerar condições não mundanas, transcendentes, estáveis de “eu”, “mim” e “meu” (ou seja, de citta).

Indo além, āsana deve gerar uma condição de isolamento em relação às agitações, ferocidades, oscilações e em relação às dualidades e às turbulências resultantes delas. Assim, as condições meditativas podem manifestar-se e citta pode absorver-se na “Infinidade”.

Prashantji termina a introdução com a seguinte pergunta: não parece risível achar que āsana deve ser meramente estável fisicamente e confortável e fácil corporalmente?

4 de setembro de 2013

Uso de cadeiras na prática de Iyengar Yoga




No calendário 2013 Body is my First Prop (O corpo é meu primeiro suporte), o mês de Setembro é dedicado à cadeira.


A seguir a tradução livre do depoimento de B.K.S. Iyengar sobre esse importante acessório.

“Viparīta Daṇḍāsana (veja a foto abaixo) é um dos āsanas que me incitaram a pensar em várias alternativas para desenvolver diferentes suportes.

A cadeira foi inicialmente usada para Viparīta Daṇḍāsana. Depois de fazer a postura em um “drum” (outro acessório usado em Iyengar Yoga, em português tambor), pensei em fazer esse āsana em duas cadeiras para aqueles que achavam o tambor difícil por causa da posição das pernas. Somente depois, percebi que até uma cadeira era suficiente para Viparīta Daṇḍāsana. Ela ofereceu apoio firme e também criou uma sensação de segurança e estabilidade.

Isto pode ser muito bem visto no Kapotāsana na cadeira. (como na figura acima)

No livro “Light on Yoga”, usei apenas um acessório — um banco para Sarvāgāsana, que vi no estúdio fotográfico quando as fotos para o livro foram feitas. Ele apoiou as costas enquanto as mãos repousavam debaixo. Comecei então a usar a cadeira para as pessoas fazerem Sarvāgāsana. No período inicial, os ombros costumavam ir diretamente no chão e o peso do aluno era direcionado erroneamente. Para resolver isso, veio o almofadão embaixo dos ombro, que também ajudou na obtenção da flexão do pescoço. O assento da cadeira oferece um excelente apoio da região da lombar e sacro e impede que esta área colapse. Os alunos podiam ajustar a postura segurando o assento da cadeira com os ombros rolando pra trás ativamente (como na figura do calendário acima). Muitas pessoas ainda não conseguiam fazer Halāsana. Então, comecei a usar outra cadeira para os pés.

A idéia de deslizar da cadeira veio muito mais tarde.”


“Para mim, o suporte não é apenas para o āsana. Ele deve contribuir para a posição do corpo que por sua vez deixa a mente calma e o estado de “citta vtti nirodha (cessação das atividades de citta) pode ser experimentado. O corpo é meu primeiro suporte. O corpo é o suporte para a alma.” B.K.S. Iyengar


Dvi Pāda Viparīta Daṇḍasāna

Eka Pāda Viparīta Daṇḍasāna