palavras do Guruji

viagens pelo mundo afora e pelo universo dentro de mim


"Você não precisa viajar a um lugar remoto para buscar a liberdade; ela habita seu corpo, seu coração, sua mente, sua Alma. A emancipação iluminada, a liberdade, a pura e imaculada felicidade estão a sua espera, mas você precisa escolher embarcar na jornada interior para descobri-las."
B.K.S. Iyengar em Luz na Vida

3 de abril de 2011

As oito pétalas do Yoga segundo B.K.S. Iyengar


O yoga tem 8 pétalas que se revelam gradualmente ao praticante. Consistem em disciplinas éticas externas (yama), observâncias éticas internas (niyama), posturas, (asana), controle da respiração (pranayama), controle e recolhimento dos sentidos (pratyahara), concentração (dharana), meditação (dhyana) e absorção no êxtase (samadhi). Chamam-se 8 pétalas porque se combinam como as pétalas de uma flor de lótus para formar um bonito todo.
(...) A jornada do yoga começa com os cinco mandamentos éticos universais (yama). Dessa maneira, aprendemos a desenvolver controle sobre nossas ações no mundo externo. A jornada prossegue com cinco etapas de autopurificação (niyama). Estas estão associadas ao nosso mundo interno e aos sentidos da percepção e nos ajudam a desenvolver a autodisciplina.
A 3ª pétala do yoga é a prática de posturas (yogasana). O asana conserva o vigor e a saúde do corpo, sem o que as chances de progresso são poucas. Também mantém o corpo em harmonia com a natureza. Todos sabemos que a mente afeta o corpo. Por que não tentar, sugere o yoga, fazer o contrário — acessar a mente por meio do corpo? (...) Em outras palavras, vamos tentar usar o asana para esculpir a mente. (...) dizemos no yoga que o sutil precede o grosseiro, ou seja, o espírito precede a matéria. Mas o yoga também diz que devemos primeiro lidar com o exterior, ou o mais manifesto — isto é, pernas, braços, coluna, olhos, língua, tato —, para desenvolver sensibilidade ao movimento interno. É por essa razão que o asana abre todo o espectro de possibilidades do yoga. Não pode haver realização espiritual e existencial sem o suporte do veículo encarnado da Alma, o corpo de carne e osso, desde os ossos até o cérebro. (...)
A 4ª pétala diz respeito às técnicas de respiração, ou pranayama (prana, energia vital ou cósmica; ayama, extensão, expansão). O alento é veículo da consciência. (...) Como a respiração acalma a mente, nossas energias ficam liberadas para desatrelar-se dos sentidos, voltar-se para dentro e lançar-se na busca interior com uma consciência mais aguçada e dinâmica. (...)
O recolhimento dos sentidos na mente (pratyahara) é a 5ª pétala do yoga, também chamada de eixo da busca interior e exterior. (...) Quando os sentidos da percepção se voltam para dentro, experimentamos o controle, o silêncio e a quietude da mente. Essa capacidade de aquietar e aos poucos silenciar a mente é essencial não apenas para a meditação e a jornada interior, mas também para que a inteligência intuitiva funcione de maneira útil e benéfica no mundo externo. (...)
As últimas três pétalas são concentração (dharana), meditação (dhyana) e absorção completa (samadhi), (...) ou o yoga da integração final (samyama yoga). (...)
Na escola aprendemos a prestar a atenção, mas não é a isso que se refere a concentração no yoga. Quando vemos um cervo na floresta, não dizemos: “veja, ele está se concentrando”. O cervo está em um estado de completa e vibrante percepção, em cada célula do corpo. É um engano comum achar que estamos nos concentrando porque fixamos a atenção em coisas instáveis, como uma partida de futebol, um filme, um romance, as ondas do mar, a chama de uma vela. (...) A verdadeira concentração é um fio de percepção contínuo. Descobrir de que maneira a vontade, trabalhando com a inteligência e a consciência auto-reflexiva, pode nos libertar da inevitável inconstância da mente e dos sentidos, sempre voltados para fora — é esse o objetivo do yoga. Aqui, o asana é de grande serventia para nós. (...)
Quando se consegue explorar, ajustar e sustentar cada novo ponto (em um asana), a percepção e a concentração se dirigem simultaneamente a milhares de pontos, e, com efeito, a própria consciência se torna penetrante e abrangente, iluminada por um fluxo dirigido de inteligência e atuando como testemunha transformadora do corpo e da mente. Esse é o fluxo de concentração (dharana) que leva a uma percepção elevada. (...)
(...) Um jeito simples de frisar a relação entre asana e dharana é o seguinte: se você aprende uma porção de pequenas coisas, um dia acabará conhecendo uma coisa grande.
Em seguida vem a meditação (dhyana). (...) Em termos técnicos, a verdadeira meditação, na acepção que lhe atribui o yoga, não pode ser praticada por alguém que se encontra sob estresse ou que tem um corpo frágil, pulmões fracos, músculos retesados, coluna envergada, mente flutuante, agitação mental ou timidez. (...)Para tanto, precisamos da preparação que nos oferecem as posturas e a respiração, o recolhimento dos sentidos e a concentração.
É por meio do asana que conseguimos relaxar o cérebro. (...)
(...) Yama, niyama, asana, pranayama, pratyahara, dharana, dhyana e samadhi, juntas, são as pétalas do yoga. A meditação está em tudo. Todas as pétalas requerem um estado reflexivo ou meditativo.
O asana e o pranayama reduzem o estresse que impregna o cérebro; com o cérebro em repouso, a tensão é liberada. Da mesma maneira, ao realizar todos os tipos de pranayama, o corpo todo é irrigado de energia. Para praticar pranayama, é preciso ter músculos e nervos fortes, concentração e persistência, determinação e resistência. Tudo isso se aprende com a prática do asana. Os nervos relaxam, o cérebro, e o retesamento e a rigidez dos pulmões se desfazem. Os nervos são auxiliados a permanecer sadios. Você imediatamente alcança a unidade consigo mesmo, e isso é meditação. (...)
(...) A dualidade é a semente do conflito. Todos, porém, temos acesso a um espaço, um espaço interior, em que a dualidade e o conflito chegam ao fim. É isso que nos ensina a meditação: a cessação do ego artificioso e o despontar do Eu verdadeiro, unificado, além do qual nenhum outro existe. (...)
(...) O asana e o pranayama são o aprendizado para transcender a dualidade. (...) Embora, a rigor, só possamos meditar num único asana, é possível executar todos eles em um estado de meditação, e é nisso que se converteu minha prática hoje em dia. Meu asana é meditativo e minha prática de pranayama, devocional. (...)
No estágio final de samadhi (união), o eu individual, com todos os seus atributos, se funde com o Eu Divino, com o Espírito Universal. Os iogues entendem que o divino não está só no céu, mas dentro de nós também, e, nessa busca final da Alma, os que buscam se tornam os que vêem. Assim, experimentam o divino no centro do seu ser. Samadhi geralmente é descrito como a liberdade final, a libertação da roda do karma, da lei da causa e efeito. Ele nada tem que ver com a perpetuação do nosso eu mortal. Samadhi é uma oportunidade de encontrar nosso Eu imperecível antes que o efêmero veículo corpóreo desapareça, como é certo que o fará, em obediência ao ciclo da natureza.
Os iogues não permanecem nesse estágio de elevada beatitude, mas, quando retornam ao mundo, suas ações são diferentes, pois sabem, no íntimo do seu ser, que o divino nos une a todos e que uma palavra ou ação dirigida ao outro é ao fim e ao cabo, igualmente dirigida a si mesmo.
(...) A profunda e transformadora jornada iogue que aguarda os que procuram a Verdade consiste na busca interna de crescimento e evolução, ou “involução”. Iniciamos essa involução com o que há de mais tangível, nosso corpo físico, e a prática de yogasana nos ajuda a entender e aprender a tocar esse magnífico instrumento que foi dado a cada um de nós.

Trechos da Introdução do livro “A Luz na Vida”, de B.K.S. Iyengar (Summus Editorial).

Nenhum comentário: